queres estabilidade, filho?
Queres estabilidade, filho, queres?
A estabilidade do desemprego a alturas nunca vistas, não é isso, filho? E a dos desempregados sujeitos a liberdade condicional, à permanente humilhação das comparências quinzenais para mostrarem que estão vivos, que não estão a enganar o Estado, a passar-lhe a perna, a esmifrá-lo, porque essa coisa das roubalheiras é primazia e apanágio do Estado e não da vulgata, do cidadão anónimo e sem voz, aquele que, como tu filho, como tu, come e cala de cara alegre porque quem protesta ou é comunista ou mau português, anti-patriótico, um pária, um traidor. E a estabilidade propiciada aos desempregados obrigados a trabalhar de borla ou a frequentar cursilhos da treta para que, enquanto o pau vai e volta por uma côdea de pão, folguem as estatísticas douradas da propaganda governamental. Não é assim, filho?
Queres estabilidade, filho, queres?
A estabilidade de um emprego cada vez mais mal remunerado porque, se não aproveitares, "há mais quem queira". A estabilidade de um emprego precário. A estabilidade de um emprego de onde te podem despedir por dá cá aquela palha porque, graças à UGT também, os patrões podem agora despedir com toda a facilidade e por tuta-e-meia. E, diz o programa do PS, e diz-nos a prática do PAF, uma maior liberalização é ainda desejável a bem da economia, porque a economia não existe para as pessoas, existe para a alta finança acumular riqueza e tu, meu filho, andares a pão e água porque laranja é luxo de remediado. A estabilidade de um emprego onde cada vez trabalhas mais - substituis outros que se vão indo embora sem que o seu lugar seja ocupado -, e cada mais mais horas, porque o governo eliminou feriados e, na sua fúria estabilizadora, quer aumentar a carga laboral de cada um e roubar-lhe os poucos direitos que ainda tem. É bestial, não é filho?
Queres estabilidade, filho, queres?
A estabilidade dos impostos que, se já estão altos, não vão descer, tomáramos nós que não subam. A estabilidade de um IRS gourmet, que te come grande parte do teu salário ou da tua pensão acrescido de complementos extraordinários que passaram a ordinários, que seria de um comilão sem a sua sobremesazinha, o seu amuse-bouche? A estabilidade de um IVA máximo na electricidade, na água, no gás, que pagas mais caro do que a maioria dos europeus. Gostas disto, não gostas, filho? Do fisco que te persegue por uns cêntimos de dívida, que, por via das dúvidas porque se não és ainda podes vir a ser, te trata como um caloteiro do piorio, te ameaça, te leva a casa, o carro, a paz de espírito, a alegria de viver. Que bom, não é filho?
Queres estabilidade, filho, queres?
A estabilidade da caridadezinha, porque o governo cortou radicalmente nas prestações sociais, a torto e a direito, mas dá milhões para a sopa dos pobres, para gáudio das Jonet e dos Motas Soares, farinha do mesmo saco, matéria do mesmo monturo. A estabilidade dos sem-abrigo, cada vez mais acompanhados porque outros tantos se lhes juntam. A estabilidade das famílias que perderam empregos, rendimentos, a esperança.
Queres estabilidade, filho, queres?
A estabilidade de uma Justiça que persegue Sócrates, ainda estamos para ver se com razão ou sem ela, e esquece tantos e tantos vilões, alguns deles encaixados em altaneiros cargos desta Nação doente, berço de um povo capado, indolente. É fantástico, não é filho?
Queres estabilidade, filho, queres?
A estabilidade de um Estado tomado de assalto por uma despudorada élite de compadres e comadres, de negociatas de bastidores, de PPP, de fundações, de milhões entregues de mão-beijada a empresários que já foram ministros e ministros que já foram empresários, num proxenetismo que tem a estabilidade de uma cama de putas. Dá-te gozo só de pensar nisso, não dá filho?
Queres estabilidade, filho, queres?
A estabilidade dos bancos que vão à falência por falta de vigilância do regulador estatal, das grandes empresas que nos levam o nosso rico dinheirinho mas pagam os impostos lá fora, das pequenas e médias empresas asfixiadas por impostos e regras e decretos e demais imposições, fechando as portas e criando mais desemprego porque assim é preciso, é a selecção natural, que caiam os mais fracos e resistam os mais fortes, as tais empresas que estão na bolsa, no grande casino, na crista da onda e onde os seus directores, presidentes, vogais e demais arraia-grossa ganha o que ganha, 10, 20, 30, 50 vezes mais do que tu, um apologista da estabilidade, um devoto da evolução na continuidade, de um Estado novo com velhos vícios.
A estabilidade dos mortos por falta de assistência médica. A estabilidade dos teus filhos que emigram porque cá não conseguem viver. A estabilidade dos jovens que deixaram de poder aceder ao ensino universitário. A estabilidade das classes profissionais, todas eles, que se manifestam constantemente nas ruas contra o governo e a propagandeada estabilidade.
Queres estabilidade, filho, queres?
Não há maior estabilidade do que a dos cemitérios. E este país está a morrer. Ajuda a acabar com ele. Pela estabilidade, por ti, pelos teus, vota PAF filho, vota PAF.
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