o concerto



Por João Paulo Guerra

Grande fartura para os trabalhadores, a que foi cozinhada ao lume brando da concertação social, mexida pelo Governo, temperada pelo patronato e empratada pela UGT: o Governo abdicou de uma medida que não existia, e que desagrada a gregos e troianos, introduzindo na legislação laboral um pacote de preceitos altamente gravosos para os que vivem da remuneração do trabalho.

Negócios destes só na compra e venda de burros da feira da Malveira. Em troca de nada, que ninguém queria, tomem lá menos proteção no emprego e no desemprego, menos salário, menos descanso.

Chama-se a isto, em Portugal, concertação: combinação, ajuste, harmonização, consenso. Um diz mata, outro diz esfola e ambos, concertados, matam e esfolam. O Governo, que supostamente representa os dois lados do confronto entre capital e trabalho, é descaradamente parcial, quando não é mais papista que o Papa, isto é, quando vai mesmo mais alto, mais longe e mais além do que o patronato espera. Ou do que a Troika impõe. Mais do que concertação, assiste-se a um verdadeiro concerto: o Governo sacode a batuta e ataca a pauta da tocata e fuga para patronato e orquestra. De vez em quando, a UGT dá um lamiré e depois mete a viola no saco. Um concerto sem conserto possível.

Tudo isto se passa em nome do aumento da produtividade e da criação de emprego, e vai ser apregoado até que se chegue à conclusão que nem a produtividade aumentou nem o desemprego baixou. Não há soluções que não sejam para mascarar a institucionalização da exploração. Paira no ar um certo cheiro a mofo, que vem talvez dos tempos da Confederação Patronal e da União dos Interesses Económicos.

O mais trágico é que, para além do empobrecimento geral, legislação como esta não vai trazer nada de bom ao País.

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