atrito e agonia
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Por Viriato Soromenho-Marques
No meio do ruído de fundo da insensatez europeia e nacional, lá se vai ouvindo uma ou outra voz que convida à lucidez. O presidente da SEDES alertou para o que parece ter sido esquecido: num terreno onde domina a desconfiança e a incerteza as sementes não crescem. Um governo que, para cumprir as exigências da troika, se transformou na principal força de instabilidade do contrato constitucional não pode esperar que os cidadãos, incluindo os empresários, invistam confiadamente, quando o quadro legal e fiscal muda constantemente em função das necessidades crescentes de receita. Seria mais sensato explicar à troika, no recato dos gabinetes, mas também no espaço público, mostrando que o Governo se compromete com o seu povo, que não é possível pagar aos credores, se estes retiram ao País os instrumentos do investimento económico (com a exiguidade do crédito e as elevadas taxas de juro, mercê da fragmentação financeira da Zona Euro), e obrigam a uma redução acelerada do défice governamental, que se torna tóxica quando combinada em simultâneo com a retração da economia das famílias, da tesouraria das empresas, o mergulho introspetivo da banca, e o aumento das despesas sociais do Estado, devido à desintegração do tecido produtivo. A política europeia hoje faz lembrar a "estabilidade" das linhas da frente ocidental na I Guerra Mundial, entre dezembro de 1914 e março de 1918. Uma estabilidade regada pelos milhões de mortos de uma guerra de atrito. Continuar a persistir na "estabilidade" dolorosa da austeridade é não só moralmente mau como intelectualmente estúpido. A troika e o Governo brincam com a resistência dos materiais. O atrito bélico e a agonia social têm limites. E quando eles são atingidos a reação em cadeia segue caminhos sinuosos e inesperados.
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