a armadilha diabólica do euro


Por Ana Sá Lopes

Quando entrámos na União Monetária, um euro valia menos de um dólar. Em Janeiro de 2002, a nova moeda equivalia a 0,9456 de dólar americano. Ontem, com os governos do sul a desmantelarem a coesão social e a mandarem uma elevada percentagem da população para a sopa dos pobres (“as cantinas sociais” enaltecidas pelo primeiro-ministro na sessão de “O país pergunta”) o mesmo euro vale bastante mais do que um dólar. 1,352 dólares a preços de ontem.

Não é preciso ser um economista fulgurante para perceber que há qualquer coisa anormal nisto. O país cujo governo manda atropelar velhinhas viúvas é o mesmo país que faz uso de uma moeda superior aos Estados Unidos (sem nunca ter tido qualquer capacidade de produzir riqueza equivalente).

A armadilha do euro foi a mais grave mistificação em que os europeus dos países do sul alinharam para alimentarem as exportações alemãs a troco de juros baixos. É verdade que em Portugal o PCP alertou a tempo, mas ninguém o ouviu porque, por definição, ninguém ouve o PCP exclusivamente por ser, como diz o ex-ministro Luís Amado, “uma força revolucionária instalada na Assembleia da República”.

Como o i noticiou esta semana, o fosso entre Portugal e o resto da Europa aumentou desde que aderimos à moeda única. E desde a crise de 2008 enquanto o euro engordava (chegou a valer no auge da crise americana 1,470 dólares), os europeus iniciaram uma depressão que recorda a América dos anos 20 – e também da Alemanha dos anos 20 com as consequências que todos sabemos. A propósito, o partido mais bem colocado para vencer as eleições europeias em França é a Frente Nacional de Marine le Pen.

É penoso ouvir as fantásticas narrativas da crise do governo e dos economistas de serviço – o “gastámos o que não podíamos” – que servem bem para gerir uma casa ou uma mercearia mas não servem para gerir nem um país nem uma zona monetária. Infelizmente, com este euro, esta política e este discurso, Portugal está condenado a não pagar dívida nenhuma, a não ter nenhuma “confiança dos credores” e muito menos o famoso “crescimento” cujos sinais de vez em quando o governo avista. O único consenso fundamental para a sociedade portuguesa é defender uma aliança dos países do sul martirizados contra as imposições da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu. O sul tem muito mais força negocial do que a que tem utilizado até agora.

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