coelho foi à lavagem
Coelho foi à lavagem. Sem sabão-macaco, sem Quitoso, sem pedra-pomes, mas com o creme da demagogia, o sabonete das falsas verdades e o pó-de-talco dos amanhãs que cantam, como é aliás seu apanágio nuns dias porque, noutros, lá vem ele ameaçar-nos com Sua Graça ou a desgraça, o falso ou o cadafalso, a batota ou a bancarrota, o ladrão ou o aluvião.
Num tempo que promete vir a ser de grande agitação social, em que será apresentado o Orçamento de Estado e anunciados os consequentes crimes "extraordinários" a praticar sobre a população, até agora indefesa porque é assim que ela quer estar, Coelho precisava de um branqueamento, de ser olhado como um ser humano, que não é, próximo do cidadão, que não está, um dos nossos, que nunca será. A RTP fez-lhe o jeitinho. Esse ser abaixo de qualquer classificação - e a de cão não cabe aqui, prezo-os muito, aos cães, para lhes fazer a desfeita - frio, arrogante, que vê números em vez de portugueses e que tem pelos portugueses um desprezo imenso, madraços e piegas, pouco alemães afinal, e ele que tanto adora a mamã Merkel, teve a oportunidade, sem o contraditório que o cidadão comum seria de qualquer maneira incapaz de fazer, mesmo que a tal estivesse autorizado, teve a oportunidade, dizia, de ter a sua sessão de propaganda que, acrescente-se de passagem, custou zero ao PSD e onde se mostrou, para quem gosta de se deixar enganar, gostos não se discutem, tão simpático que deve ter havido por aí muita velhinha, viúva ou não, a sentir compaixão por tão afável senhor, elegante e bem falante, um ai-jesus, um menino na mão das bruxas, esses socialistas, comunistas e os masoquistas de que falava Cavaco.
Coelho não foi ele, foi outro por ele, tão lavado e enxuto que até parecia novo. Levou a lição bem estudada (as perguntas foram de surpresa ou, coisa que não me espanta, teve conhecimento delas antes do programa?), papagueou o que quis e como quis, sem ninguém que o obrigasse a não torpedear as questões, respondendo a alhos quando lhe falavam em bugalhos, parecem mas não são iguais.
Agradeçam ao Ponte. Vender primeiros-ministros, a sua honra, a sua palavra, o acerto das suas políticas é, prova-se, tão fácil como vender cerveja.
Para isso está lá o Ponte. Um dos grandes serviços que Relvas prestou a Passos, abençoado seja esse grande mestre da língua portuguesa e negócios afins.
A gasolina está cara? É bom que esteja que é para preservar o ambiente.
O aumento do IVA não tem nada a ver com a falta de clientes nos restaurantes.
Não tem dinheiro para pôr os seus filhos a estudar? Peça subsídios.
Comigo, o SNS tem prestado um excelente serviço aos portugueses.
A situação dos aposentados não será pior em 2014 do que foi em 2012.
Nós não queremos que os jovens emigrem.
Chegam estas pérolas ou quer mais, para arrumar de vez com a figadeira?
Coelho só foi ele mesmo quando disse, já no fim e sintomaticamente respondendo a uma pergunta do jornalista e não do público, que Machete não fez nada de recriminável. Na óptica do primeiro-ministro, para quem o roubo não é um crime mas um alto desígnio nacional, em que ele se considera arauto, profeta e deus todo poderoso, os pequenos pecadilhos de Machete são questões de lana-caprina, arremessos de uma oposição, essa sim, criminosa.
Pois. Isso. E assim. Mas que também.
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