o arraial de outubro
O que me espanta, o que me irrita, o que me enoja, é o estadão num país em estado de coma, são os mestres de cerimónia, os polícias, os guarda-costas, o Costa engalanado, a Esteves sorridente como sempre, o Coelho sempre-em-pé, o mesmo hirto Silva de sempre, a carraria a armar ao pingarelho, os trajes de luxo, a desfaçatez desta malta que, por via do voto, pensa que tem legitimidade para tudo, até para o roubo mais descarado, a mentira mais infame. O que me amargura é terem sido tão poucos a vaiá-los (eu, pecador, me confesso: não estive lá). O que me dá orgulho é o humor em hora de desamor, é a palavra certeira, é a ironia que fere, a indignação que ferve. E, além do mais, não é todos os dias que podemos ver o famoso Serra guardando os costados do chefe, tão impávido e sereno o Serra, tão elegante o Serra na sua fatiota domingueira comprada, sabe-se lá, talvez num fanqueiro a Massamá para não ficar longe do chefe, o chefe é tudo, o chefe é deus, o chefe é "the next best thing" depois de Salazar, é o Caetano mas em bom.
Ah, quantas estórias guardarei destes anos de chumbo, no dizer de Portas a quem um chumbo ou dois não iriam mal, iriam até muito bem. Quantos trastes, quantos tristes, quanta velhacaria, quanto velhaco sem pingo de vergonha, sem ponta de lucidez, de apego à Pátria, de amor ao próximo.
Fotografia: Daniel Rocha/http://www.publico.pt/
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