o desfazer dos mitos

Por Baptista-Bastos

"Que mais me irá acontecer?", perguntava, numa telenovela, há anos, a personagem desempenhada por Nicolau Breyner. Faço uma paráfrase e coloco a pergunta no plural. Que mais nos irá acontecer?, embora para desgraça já baste. A insensibilidade trágica de Pedro Passos Coelho talvez esteja associada à funesta incompetência de que faz constantes provas, e à "crença" entendida, largo senso, como modo efectivo de representação ideológica. Ele disse que é determinado, mas não intransigente. A frase, inócua, está longe de definir os princípios políticos que fundamentam a sua acção, caracterizada pela obediência cega a modelos que constituíram malogros clamorosos.

O incidente com a taxa social única devolve-nos a imagem de um homem que funciona através de momentos emocionais. A intransigência, mascarada de "determinação", esteve próximo de ocasionar danos gravíssimos, ainda maiores do que aqueles provocados pela cegueira ideológica, causadora da actual desestruturação social.

A maior parte das categorias da nossa vida intelectual e política funciona no sentido do medo, do desassossego e da insegurança. Passos Coelho é o arauto e o motor desses estados. E a surpresa maior é que, talvez, nem ele próprio disso se dê conta. Cedeu, de má vontade, à supressão da TSU, mas logo arranjou um substituto convergente, por igual pernicioso: aumento do IRS, fora o que está para surgir - o aumento caudalosos dos impostos e dos constrangimentos nos quais estamos a viver.

Ele demonstra que não possui ideias de seu: funciona na base de registos nunca garantidos pelas ciências sociais e, até, negados pela História recente. O ultraneoliberalismo de que se faz eco encaminha-nos para uma situação irremediável, de que os últimos acontecimentos são resultado e prova. O poderoso protesto de 15 de Setembro provou não só o descontentamento transversal e generalizado, como o aviso declarado de um poder, o das redes sociais, que revelou a natureza impetuosa da reafirmação de princípios fundamentais, e as debilidades da Imprensa actual, a qual não nos fornece o retrato do que, realmente, acontece. É impressionante a qualidade literária e jornalística de muitos blogues, e as fraquezas do texto de quase todos os jornais. A democracia de superfície provoca a aparição de uma Imprensa superficial. As pessoas de recta intenção não querem uma e detestam outra.

Foi, aliás, nas redes sociais onde o combate feroz às injustiças generalizadas mais se fez ouvir. O lado oculto, sombrio e inquietante deste Governo encontrou, na net, respostas demolidoras, colocando, sob a luz da razão e do entusiasmo crítico, a sua índole criptofascista. Creio que se desfez o mito da passividade colectiva. Simultaneamente, os partidos foram advertidos de que assim - não.

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