o papa e o papão islâmico
Redacção do jornal Charlie Hebdo, Novembro de 2011 |
Quantas vezes tenho gozado com Suas Santidades, as várias que se têm sentado no trono que um dia foi de S. Pedro. E, também o tenho confessado sem rebuços nem receio de excomungação, abomino a padralhada, aqueles e só aqueles padrecas que têm contribuído para o atraso congénito de Portugal e dos portugueses, os que defendem o mal em vez do bem, a extorsão em vez da dádiva, a ganância em vez da solidariedade. Já tenho dito muitas vezes, e esse deve ser o sacrilégio máximo para as almas mais apostólicas, que Jesus Cristo, a ter existido, foi o primeiro a propagar ideias que, muitos séculos mais tarde, seriam retomadas pelos comunistas (que, no entanto, não tendo morrido cedo como Jesus, depressa malbarataram as suas prédicas com práticas nem sempre sãs, nem sempre santas). Homens. Que estragam tudo onde metem as mãos, sejam os ideais de Cristo sejam os de Marx ou de Lenine. Contudo, apesar das minhas muitas heresias, nunca ninguém se zangou comigo, pelo menos ao ponto de me atirarem para a fogueira sem apelo nem agravo ou de me incendiarem a casa num moderníssimo auto-de-fé. Não se passa o mesmo no mundo árabe. Alguém na América fez um filme, ao que parece a parodiar Maomé, desencadeando uma onda de violência que culminou com o assassinato de um embaixador e a destruição de embaixadas e consulados dos Estados Unidos, isto se a coisa se ficar por aqui. E o mundo ocidental amedronta-se, condena a realização do filme, asfixia a liberdade de expressão em nome de um deus menor (como o são todos, pelo menos para mim, ateu com muita honra, descrente com muita crença). Em França, a redacção do jornal humorístico Charlie Hebdo foi incendiada em Novembro de 2011 por ter satirizado Maomé. O jornal saiu hoje mesmo com nova edição onde o fundamentalismo islâmico não é poupado. Não sei se o jornal é de direita ou de esquerda, de extrema-direita ou extrema-esquerda. Nem isso me interessa agora. O que sei é que tem todo o direito de publicar as caricaturas que muito bem entender. E o Estado francês de defender o jornal e os seus trabalhadores e proprietários. Ainda para mais no seu próprio país, respeitando as suas próprias leis. A Humanidade está a perder a cabeça. Os conflitos sucedem-se. Mas baixar a cabeça, contemporizar com actos de barbárie, não vai amainar os ânimos, vai antes deitar mais achas para a fogueira. Que nos consumirá um dia destes.
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