no limiar da dignidade
Por Paulo Ferreira
O número de novos beneficiários do Rendimento Social de Inserção (RSI) mais do que triplicou durante o primeiro trimestre deste ano, relativamente aos dados dos últimos três meses de 2011. Ao todo, há agora 330 mil pessoas cujo único rendimento provém desta prestação social. Quase 40% dos beneficiários são menores!
Não é despiciendo lembrar o que é o RSI, para tomarmos devida nota da dimensão do que está aqui em causa. O RSI é uma prestação monetária que pretende satisfazer as necessidades básicas (sublinho: básicas) de quem prove não ter suficientes fontes de rendimento para viver com um mínimo de dignidade. Além disso, é suposto o RSI promover - ou ajudar a promover - a integração social e profissional de quem dele beneficia. Quer dizer: estamos a falar de um instrumento de ajuda aos absolutamente necessitados.
Para percebermos quão decisivo o RSI pode ser para indivíduos e famílias, basta olhar para os valores atribuídos - o valor médio da prestação foi, em março, de 91,7 euros (qualquer coisa como 3 euros por dia); o valor médio mais elevado, entregue no distrito de Bragança, foi de 103,4 euros; o valor médio mais baixo, entregue nos Açores, foi de 76,4 euros (2,54 euros por dia). Estamos no mínimo dos mínimos, estamos para lá do limiar da pobreza, estamos a roçar o limiar da dignidade.
Para lá da tragédia que mostram, os números espantam? Sim e não.
Sim, porque com a criação da chamada condição de recursos, que deu um forte aperto nos critérios de atribuição do RSI, era suposto que o número de pessoas e famílias beneficiadas caísse, pelo menos, entre 20% e 25%. Não caiu - subiu.
Sim, porque o esforço de fiscalização feito pelo Ministério da Segurança Social permitiu baixar as prestações indevidamente atribuídas, por um lado, e, por outro lado, fez subir a recuperação coerciva das ajudas ilegalmente prestadas.
Sim, porque o esforço de reinserção devia tirar do sistema algumas largas centenas de beneficiários. A verdade é que, em vez disso, cresce o número dos que regressam ao RSI, depois de lá terem conseguido sair.
E não. Não, porque a crise gerou uma significativa quebra do rendimento médio, deixando indivíduos e famílias à beira da falência (senão mesmo mergulhados nela).
Não, porque o aumento em espiral do desemprego empurra quem não tem trabalho para fora do sistema. Isto é: empurra-ºos para o recurso ao RSI.
Não, porque metade das 800 mil pessoas que não têm emprego já não recebe subsídio. Ou seja: é empurrada para o RSI.
Quando vai isto parar? Só há uma certeza: a reestruturação em curso da economia portuguesa vai atirar borda fora muitos mais milhares de portugueses. E o RSI não vai chegar para amenizar os estragos.
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