os limites e os constrangimentos que nos cercam

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Por Baptista-Bastos
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O caso Sócrates (se, de facto, há "caso") inundou de perplexidade a perplexidade do viver português. As peripécias que envolveram a detenção do ex-primeiro-ministro e, depois, as declarações de Mário Soares, à entrada da prisão de Évora, irritaram meio mundo e o outro, e ambos esses meios têm a sua dose de razão. Soares é o que é, e nada a fazer para alterar o comportamento do velho político. Mas é comovedor que um homem à beira dos noventa anos se desloque de Lisboa, manhã cedo, para abraçar um amigo em dificuldades. Se as afirmações de Soares inquietaram outros, o mal será deles. Há que destruir a tese de conspiração, a começar pelo esclarecimento que é devido a quem não sabe o que se passa. Afinal, Sócrates é acusado de quê? Com fundamentos mais rigorosos e, acaso, mais consistentes, o dr. Ricardo Salgado beneficiou de um tratamento ameno, fazendo nós comparações nada apressadas, mas evidentes.

A verdade é que o País segue, arfante, o desenrolar destes acontecimentos. A Esquerda com a desconfiança que lhe é apropriada; a Direita asseverando que "a justiça está a trabalhar bem." O Governo rejubila com este "intermezzo" e continua a cometer as suas feias malfeitorias; os jornalistas e os comentadores estipendiados não alteram, um milímetro que seja, a linha tortuosa do seu pensamento, e entretanto, o País não pára de sofrer as inclemências de uma política que ninguém sabe aonde nos leva. O inestimável dr. Cavaco reafirma estarmos no bom caminho, a SIC parece paralisada e um pouco embrenhada na confusão dos seus articulistas encartados, e sem estímulos intelectuais, que reavivassem as nossas meninges, estamos à espera que o caso Sócrates tenha uma solução. O mal-estar é evidente. Aguarda-se outro escândalo à sobreposse, que apague ou diminua as ondas de choque por entre as quais vamos sobrevivendo.

Parece que atribuem pouca importância à medonha notícia, repetida nas televisões, segundo a qual uma em cada três crianças portuguesas vive na faixa da pobreza, quer dizer: da miséria. Secamente, a notícia é assim dada, seguindo-se o peditório sacramental para que as ajudemos. Não se esclarece que a teoria do empobrecimento foi um dos itens do programa do dr. Passos Coelho, imediatamente posto em prática com os despedimentos, os cortes nos salários, o desemprego em massa, a redução dos salários, das pensões e das reformas; a diminuição dos Orçamentos do Estado nos capítulos do financiamento social ao ensino, à saúde, à segurança.

Os nossos miúdos, às centenas, acaso aos milhares, vão para a escolas (as que reabriram) sem uma côdea de pão nos estômagos porque os pais estão desempregados e não há dinheiro em casa para pagar as rendas, quanto mais para uma sopa na mesa. O Portugal do dr. Passos e do dr. Cavaco não é a litografia pastoril que eles e os apaziguados apresentam. É esta miséria sórdida que, por exemplo, nos expõem as fotografias de Eduardo Gageiro, que recuperam a fome e a tristeza, quando julgávamos ter desaparecido do mapa da nossa melancolia.

Já suprimi dois jornais diários das minhas leituras e interesses. Já deixei de adquirir, há anos, o semanário do dr. Balsemão, e disse-lho porquê, num almoço para que me convidou. Não vejo quase todas as televisões, pelo enjoo das doses maciças de futebol, todos os dias, a todas as horas, com os habituais comentadores do óbvio, sem o mínimo respeito pelos telespectadores. "Se não quer ver e ouvir, desligue o aparelho, ou mude de canal", ouve-se dizer. Uma falácia de ignorantes, porque as imposições estão à vista, e a aldrabice das audiências não explica nem determina as "preferências" do público.

Estamos limitados pelas próprias limitações culturais de quem programa. Estamos mesmo?

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