a venda da rapariga
Ontem foi dia de gala não sei onde, devia ser no salão nobre do ministério das Finanças. Ou da Economia. Os papás estavam lá. Albuquerque sorria, enlevada. Lima, de taxa arreganhada também, até esqueceu as taxas e taxinhas e as bejecas de que já foi rei. Babados, ofereceram a sua menina gastadora aos novos pais que, de olhos húmidos tanta era a comoção, prometeram tratá-la bem, adoptiva mas tão amada como os outros filhos desde que comece a render cedo, a contribuir para o pecúlio da família. Prometeram-lhe roupas novas, mesada, comida a rodos. A menina está em boas mãos. Vai voar alto. Vai voar longe. Ser alguém na vida. Dar aos novos país o lucro que nunca deu aos velhos, a Albuquerque & Lima, Sociedade Anónima de Irresponsabilidade Ilimitada. Porque, ou muito me engano, ou a família de acolhimento vai estrafegar a criança. E não será com mimos. Vai pô-la a render e abandoná-la quando já for só sucata. Nessa altura, voltaremos a acolher a menina. E a pagar-lhe os tratamentos, a aliviá-la dos traumas de uma venda espúria.
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