o sexo e o coelho na vida da minha tia laurinda


Por vezes, chamam-me radical. Bom, a falar verdade, verdadinha, também me chamam coisas piores, mas vou-me ficar pelo radical. Quero uma sociedade mais justa, quero a mitigação da pobreza, de preferência a sua erradicação, quero paz na Terra entre os homens de boa e má vontade, estes últimos à força mas nunca à forca. Não sou sequer visceralmente contra o capitalismo, veja-se como o próprio PCP apela ao consumo como forma de fazer crescer a economia. Sou é a favor de um capitalismo humanizado, regulado, rigorosamente vigiado, impedindo abusos, prepotências, egoísmos, corrupção e a aviltante acumulação de riqueza por quem paga, aos seus colaboradores, a miséria de um salário mínimo. Se isso é ser radical, pois que o seja. Mas acho que radical, radical, é antes a minha tia Laurinda. Essa sim, é radical. Tem mais trinta anos do que eu, e olhem que os meus "doces" anos da juventude já se foram há muito, mas continua a conduzir, fuma daqueles cigarros fininhos de dama perliquitetes, bebe o seu uísque de vez em quando - "para descontrair", diz ela -, viaja sempre que poupa umas massas da sua reforma cada vez mais espoliada, vai ao cinema sozinha se não tiver companhia, vai à praia, nada, toma banhos de Sol, veste fato de banho como qualquer menina na puerícia, pinta-se moderadamente como qualquer donzela púbere e ... namora com um senhor de idade igualmente respeitável, assumindo a sua relação e o seu gosto pelo sexo, "é o que a gente leva desta vida", diz usando a frase batida que, na sua boca, ganha novidade. Isto é que é ser radical. E, pelas minhas previsões mais pessimistas, a tia Laurinda vai enterrar-nos a todos, Coelho incluído. A tia Laurinda come carne, vermelha ou magra ou gorda tanto se lhe dá como se lhe deu, mas detesta coelho. Vá-se lá perceber porquê. Adoro a tia Laurinda, mesmo sendo personagem de ficção. É que é bom dar asas ao sonho e largas à imaginação. A vida é crua demais.

Radical, eu? Devia conhecer a minha tia Laurinda.

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