"apocalypse now!"

Por Baptista-Bastos

«O capitalismo é uma nova tirania.» A frase é do papa Francisco e pertence a um texto de análise do mundo moderno. Realmente, desde a queda do Muro de Berlim, saudada com estrépito como uma etapa única e exemplar da democracia, o capitalismo deu azo à sua natureza predadora. Deixá-lo à solta, como exclusiva possibilidade de felicidade na Terra, sem o contraponto de um outro sistema, deu origem, em menos de duas décadas, a um cortejo de miséria e de desavenças ainda não concluído. O reflexo dessa anormalidade tem tido, em Portugal, efeitos medonhos. Sempre fomos subalternos de muitas coisas, sobretudo de raiz ideológica, e se Salazar e a sua acção resultam dos fascismos europeus, e a sua manutenção é devida às sórdidas cumplicidades das «democracias» europeias, nunca atentámos em conseguir uma característica específica. Como, aliás, prognosticaram alguns portugueses ilustres como Verney, Oliveira Martins, Raul Proença ou António Sérgio.

Ao caracterizar o capitalismo como nova tirania, é susceptível de se entender que o Papa recomenda uma acção antagónica. O capitalismo não é passível de reforma, e a História no-lo ensina que as suas perversões só têm sido erradicadas com extrema violência, a violência que ele aplica por onde passa e quer assentar arraiais. Claro que a crise por que o mundo atravessa e, em Portugal, a pressão que sobre o mundo do trabalho se verifica, estão a dar sinais de saturação, provocada pelo desespero. A política e os políticos deixaram de existir. A finança sobrepôs-se ao poder natural dos Estados, e assiste-se, hoje, à capitulação dos governantes que, na verdade, não governam coisíssima nenhuma. Os casos da Grécia e de Chipre decorrem dessa «nova ordem» predadora, que, por enquanto, não tem opositor à altura.

Com este Governo maldito é um fartar vilanagem. Subordinado a uma Alemanha, cuja vocação guerreira e hegemónica é secular, não consegue desembaraçar-se do canto da sereia, seguindo, de outro modo, o carneirismo de uma França debilitada por carência progressista, e por um dirigente «socialista» que envergonha as tradições do grande país. O resto da Europa está igualmente cabisbaixo.

Que fazer? Como diz um estribilho exposto nas manifestações populares dos últimos tempos, «Nem sempre quem luta, ganha; mas quem não luta perde sempre.» Na sessão da Aula Magna, promovida para defesa da Constituição e dos valores que nos têm animado, Mário Soares advertiu que as ameaças de violência estão a tocar no batente da nossa porta. Logo, um coro de cortesãos curtiu as lágrimas da tolerância que se concede aos velhos, e causticou as palavras do ex-Presidente da República como incitamento à força. Nenhum desses carpideiros esclareceu as origens da violência, que partiam de um Governo inclemente e muito pouco democrático. O costume.

Adensam-se os perigos e a paz está seriamente ameaçada. O anseio de uma Europa sem guerras, nascido do belo conceito de uma União onde a tranquilidade e o sossego reinariam, está em estilhaços. O ataque começou aos «países periféricos» e o tandem Alemanha-França cedo pendeu para o primeiro daqueles países. Adicione-se a esta evidência um requintado gosto de vingança e retaliação, que se tem espalhado. Já nos esquecemos daquele velho grego que pôs fim à vida, com um tiro na cabeça, frente à Assembleia. «Que fez a Grécia para merecer esta tragédia?», teria dito. «Os hunos querem lá saber se a civilização nasceu ali!», comentava François Camain, no «Liberation», ainda não há muito tempo. A «grande coligação» entre a trupe da senhora Merkel e o SPD não vai alterar as políticas de depredação, e as «cedências» ao partido social-democrata não passam de pequenos remendos numa estratégia extremamente preocupante. Será o partido de Willy Brandt «engolido» pelas pressões de uma época que deixou de cuidar do factor humano para capitular em nome de um sinistro «pragmatismo»?

Os próximos meses serão decisivos para o aclaramento da situação. E o grupo de Passos Coelho está, apenas, à espera desses acontecimentos, para agir «em conformidade», como se costuma dizer nos relatórios policiais. Temos de nos precaver contra novas investidas de uma tirania (como lhe chama o Papa) disposta a tudo para exercer um domínio total.

Até lá, bom dia e boa sorte.

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